13 março 2014

Carta a Alice #9

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Faz sol. As azedas começam a marcar tudo por onde o olhar se perde. O ar já não pesa tanto, o respirar não é o mesmo custo. Queria muito mostrar-te tudo isto... a cor amarela das azedas, o chilrear dos pássaros (que entra pelos ouvidos de uma forma tão feroz), o cheiro, este cheiro de Primavera, de (re)início de vida que é tão marcante. Queria mostrar-te isto tudo. Fazer-te sentir o sol na pele, o amargo das azedas na boca, a terra nas mãos. A vida. Queria fazer-te sentir a vida, ter-te presente, porque o foste apesar de não seres. E o que faço no impulso, naquele instante em que alguém me pergunta? Nego-te. Nego a tua existência. E é como se me tivesse espetado, é como se uma faca me abrisse o peito. Digo-o rapidamente, despeço-me ainda mais rápido, com votos de felicidade e com a certeza que tudo irá correr bem. Fujo. Não aguento a dor que me rasga o peito, porque não fui capaz de te preservar (só para preservar os outros).

Foste, és e serás. E eu tive, nós tivemos, nós temos. Afirmativo, sem negar, sem negação. Tu és filha. Nós somos (pai e mãe). 

Faz sol. Mas não posso (não podemos) mostrar-te o amargo das azedas, as andorinhas que chegam, o toque da terra, o cheiro da Primavera.


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