26 março 2008

um dia...


adamastor - duarte almeida

O mostrengo que está no fundo do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tectos negros do fim do mundo?
E o homem do leme disse, tremendo:
El-Rei D. João Segundo!

De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?
E o homem do leme tremeu, e disse:
El-Rei D. João Segundo

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um Povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!

O Monstrengo - Fernando Pessoa






6 comentários:

Rui disse...

Mais um momento Egoísta?
Com o alto patrocínio do café Nicola ;-) O "tal"... do Pessoa!

Estará tudo relacionado...? humm :-)

JFDourado disse...

A primeira vez que ouvi este poema foi pela voz do João Villaret, num disco de vinil do meu pai. Que saudades que tinha sem o saber.

:)

Ana disse...

Rui: relacionado está, pensado nesse sentido é que não foi;)*

Vinil com o João Villaret?! Que belo tesouro esse!!:)*

Pedro Beltrao disse...

Essa primeira foto esta mesmo muito fixe :)

Andreia disse...

"Um dia encho-te o quarto de flores. Hoje é o dia". Li isto ontem e achei delicioso. Como este post, o teu espaço :) Beijo

Ana disse...

obrigada:) *